segunda-feira, 1 de março de 2010

5 dias 5 poemas

Aqui ficam dois dos seis poemas seleccionados.

Fui Sabendo de Mim

Fui sabendo de mim
por aquilo que se perdia

pedaços que saíram de mim
com o mistério de serem poucos
e valerem só quando os perdia

fui ficando
por umbrais
aquém do passo
que nunca ousei

eu vi
a árvore morta
e soube que mentia

Mia Couto,in "Raiz de Orvalho e Outros Poemas"




Do Que Nada se Sabe


A lua ignora que é tranquila e clara
E não pode sequer saber que é a lua;
A areia, que é a areia. Não há uma
Coisa que saiba que sua forma é rara.
As peças de marfim são tão alheias
Ao abstracto xadrez como essa mão
Que as rege. Talvez o destino humano,
Breve alegria e longas odisseias,
Seja instrumento de Outro, Ignoramos;
Dar-lhe o nome de Deus não nos conforta.
Em vão também o medo, a angústia, a absorta
E truncada oração que iniciamos.
Que arco terá então lançado a seta
Que eu sou? Que cume pode ser a meta?


Jorge Luís Borges, in "A Rosa Profunda"

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